03/06/2014 - Elementos de crescimento que prevaleceram nos últimos 17 anos não existem mais. Segundo Luiz Carlos Mendonça de Barros, o cenário não é de crise mas falta investimento
Todos os elementos de crescimento que prevaleceram nos últimos 17 anos não existem mais. O cenário não é de crise, mas falta investimento. O ânimo do empresário, porém, foi atingido por "agressões" vindas do Governo e, com o juro mais alto, preferiu manter dinheiro aplicado a elevar produção, diz o ex-presidente do BNDES Luiz Carlos Mendonça de Barros.
Integrante do Governo tucano de Fernando Henrique Cardoso, ele defende que uma eventual vitória de Aécio Neves (PSDB) trará o choque positivo que falta para que o investimento volte a fluir, mas não descarta que a presidente Dilma Rousseff possa se recompor com o setor privado, se agir diferente. Sobre as razões que o fizeram investir em meio a tanto mau humor - Mendonça de Barros é presidente da Foton Aumark do Brasil, representante da maior fábrica de caminhões da China -, ele assume que, apesar de tudo, a situação da economia brasileira é "muito superior à do passado".
Mesmo com tantas iniciativas do Governo, o investimento desacelerou. O que aconteceu?
Luiz Carlos Mendonça de Barros: Vendo que não há mais espaço para crescimento de demanda por uma restrição de oferta, o empresário deveria investir. Só que o governo Dilma, com todas as agressões que fez ao setor privado, como a confusão na energia elétrica, tirou o ânimo de investimento do empresário. Todos os índices de confiança, até em serviços, tomaram um tombo nos últimos tempos. A demanda ainda teria condições de crescer se tudo o mais ficasse constante. Mas o BC foi obrigado a interferir subindo o juro e aí o quadro de desânimo que já existia só piorou. Com a combinação de falta de confiança e juro em alta, todo mundo preferiu manter dinheiro aplicado ou deixar de gastar no aumento de produção. Esse é o resumo dos números (do PIB).
O que está errado?
Mendonça de Barros: O PIB é uma comprovação dura de um quadro que existe há algum tempo: o consumo bateu no teto. Entre 1993 a 2011, o consumo de energia elétrica cresceu a uma taxa de 3,7% ao ano, o que é impressionante. No período todo, o consumo andou à frente do investimento, e qualquer ociosidade que existia foi ocupada. Em 2010 houve uma esticada do Governo para manter esse crescimento e, quando Dilma tomou posse, a economia bateu na parede. Esse quadro é normal para uma economia que cresceu tanto por muito tempo. O fato é que todos os elementos de crescimento que prevaleceram nos últimos 17 anos não existem mais. O modelo dos anos Lula está esgotado e, se depender só do consumo, o PIB brasileiro vai continuar medíocre.
Além do investimento, a poupança também é baixa...
Mendonça de Barros: A queda da taxa de poupança significa que o consumo da sociedade aumentou - e não foi do setor privado, foi do setor público. E isso quer dizer que não sobra dinheiro para investimento. Não acho que seja uma crise séria, eu sempre disse isso. Ao não ler corretamente a armadilha da falta de investimento, o Governo elevou o próprio consumo. E ao fazer isso, jogou mais lenha na fogueira da inflação. Ficou um negócio contraditório: o Governo aumenta o consumo e o BC, os juros. A situação é fruto da incapacidade analítica do Governo de entender os reais desafios da economia.
Como salvar 2014?
Mendonça de Barros: Esperamos alta de 1,5% do PIB e não existe mais tempo para melhorar isso no curto prazo porque estamos em ano eleitoral. 2014 já está dado e mesmo o BC parando de subir o juro, ele já está suficientemente alto para inibir o crescimento. Todas expectativas vão ser jogadas para o próximo ano.
O sr. vê uma inflação pressionada por muito tempo?
Mendonça de Barros: Ela vai ficar por aí. Além dela, as importações em alta em detrimento da produção local também preocupam. E só existe uma forma de sair disso: via investimento privado.
O que esperar para 2015?
Mendonça de Barros: Se houver novo mandato da presidente Dilma sem que ela consiga passar uma mensagem clara de que vai mudar a política econômica para tentar sair da armadilha atual, vamos ter um choque negativo de confiança. E nesse cenário em que o investimento é a saída, teremos uma piora das condições de hoje.
As previsões mudam caso a oposição ganhe as eleições?
Mendonça de Barros: Com a vitória do Aécio, o cenário é diferente. Ele mostra que terá equipe econômica respeitada pelo mercado e é esse choque positivo de confiança no setor privado que vai provocar a volta de investimento. O Eduardo (Campos) não conheço.
De qualquer forma, o sr. não vê um primeiro ano difícil de mandato, cheio de desafios?
Mendonça de Barros: A situação da economia brasileira é muito superior à do passado. Hoje, 70% dos brasileiros vivem na economia formal e essa é uma mudança social que pouquíssimos países emergentes fizeram nos últimos anos. Agora é uma questão de ajustar a política econômica e usar esse novo ativo que o Brasil tem, que é uma classe média tão grande, para voltar a crescer. Se esse cenário for bem entendido e explorado pela política econômica, a rapidez com que vamos voltar a crescer vai surpreender todo mundo.
O sr. está envolvido com a candidatura de Aécio?
Mendonça de Barros: Não. Eu estou envolvido nessa minha brincadeira nova de caminhões. Eu quero é a economia voltando a crescer.
Mas, em meio a todo mau humor, o sr. assumiu há pouco a presidência de uma empresa de caminhões. O que lhe faz investir?
Mendonça de Barros: Minha leitura sobre o Brasil é muito positiva. O grosso da população está estudando mais, se aperfeiçoando, e essa dinâmica me faz acreditar. Vamos torcer para que, se Dilma ganhar, tenha condições de falar "olha setor privado, vocês são fundamentais à retomada. Me desculpem se não nos entendemos bem no primeiro mandato, mas eu garanto que no segundo vamos trabalhar juntos". Se ela conseguir isso, a coisa anda.
(Fonte: Valor Econômico - 02/06/2014)